Tuesday, August 8, 2017

Intubação de Sequência Rápida: o que você precisa saber

Por Juliana Gregório Avelar e Matheus Carvalho Silva


INTRODUÇÃO E DEFINIÇÕES

Na avaliação inicial do paciente crítico, na emergência ou na UTI, o manejo da via aérea para garantir uma ventilação e oxigenação adequada é essencial. A intubação de sequência rápida (ISR) é considerada a melhor técnica para intubação, pois minimiza os riscos de regurgitação e aspiração de conteúdo gástrico. Necessita de habilidade manual e conhecimentos farmacológicos de drogas hipnóticas, sedativas e relaxantes musculares. Vamos tentar abordar resumidamente os principais pontos em relação a esse assunto fundamental para todo médico.


INTUBAÇÃO OROTRAQUEAL (IOT)

A intubação orotraqueal é um procedimento realizado em muitas situações de emergência, que visa à colocação de um tubo no interior da traqueia para assegurar um suporte ventilatório eficiente e seguro.

O paciente deve ter um acesso venoso de bom calibre e estar devidamente monitorizado.


MATERIAIS

O laringoscópio é constituído de um cabo e uma lâmina dotada de sistema de iluminação. Existem as lâminas retas, que elevam diretamente a epiglote, e as lâminas curvas, que pressionam o ligamento glossoepiglótico (valécula) para fletir anteriormente a epiglote.  Geralmente a lâmina curva número 3 é recomendada para adultos. Para crianças, são preferíveis as retas.

Além do laringoscópio, são necessários tubos endotraqueais de diferentes tamanhos (o tubo deve ser o maior possível; em geral, tubos 7,5 a 8,0 para mulheres e 8,0 a 8,5 para homens), dispositivo bolsa-válvula-máscara, aspirador, seringa de 20 mL, um fio-guia, máscara facial, óculos, luvas estéreis, cânula orofaríngea, ventilador previamente testado e estetoscópio. Vale lembrar que a equipe deve estar preparada para agir em caso de parada cardiopulmonar e para casos de via aérea difícil, em que o uso de máscara laríngea ou cricotireiodostomia de emergência podem ser necessários.


INDICAÇÕES

Três perguntas são fundamentais na tomada de decisão sobre intubar ou não um paciente. 

  • Há dificuldade em manter a via área pérvia ou protegida? 
  • Há dificuldade em manter a ventilação ou oxigenação? 
  • Há algum sinal que indique um curso clínico desfavorável para as vias áreas?



TÉCNICA

Primeiro se deve posicionar corretamente o paciente, colocando um coxim na região occipital para alinhar os eixos faríngeo, laríngeo e oral, com hiperextensão da cabeça.

O emergencista deve segurar o laringoscópio com a mão esquerda e abrir a boca do paciente com a mão direita. Em seguida, introduzir a lâmina do laringoscópio pela borda direita da boca do paciente, até que a lâmina se insira na valécula (lâmina curva) ou ultrapasse a epiglote (lâmina reta). Nesse momento, o cabo deve ser tracionado para CIMA e para FRENTE. É muito importante não realizar o movimento de alavanca, que pode causar traumatismo dentário.

Assim que visualizar as cordas vocais, o médico deve passar o tubo endotraqueal. A borda proximal do balonete deve ultrapassar as cordas vocais. Confirmar a introdução correta do tubo pela visualização de vapor de água no tubo, expansão bilateral do tórax e pela ausculta primeiro do epigástrio e depois das bases pulmonares e campos médios axilares esquerdo e direito. A confirmação com capnografia é obrigatória, mas nem sempre está disponível nas emergências. Depois de confirmada a correta posição do tubo, inflar o balonete com não mais do que 20 mmHg de pressão e fixar o tubo.

Por fim, deve-se solicitar uma radiografia de tórax para confirmar o posicionamento do tubo (3 a 5cm da carina) e diagnosticar eventuais complicações.


POSSÍVEIS COMPLICAÇÕES



INTUBAÇÃO DE SEQUÊNCIA RÁPIDA (ISR)

A intubação de sequência rápida tem como característica a administração de um hipnótico e um bloqueador neuromuscular após um curto período de pré-oxigenação.


Dividimos a ISR em algumas etapas:.

Preparação

É o momento de definir as drogas a serem utilizadas, de acordo com as características do paciente, para colocá-las em seringas identificadas. Deve-se também verificar o funcionamento do laringoscópio (se certificar de que a luz está branca) e testar também o tubo. O aspirador da sala deve estar preparado com uma sonda estéril. O paciente deve estar com monitorização da pressão arterial, cardioscopia, acesso venoso e oximetria de pulso.  O uso de capnógrafo de onda é sempre desejável.

Pré-oxigenação

Caracterizada pela oferta de oxigênio a 100% ao paciente por aproximadamente três minutos. Isso permitirá a desnitrogenação das vias áreas e um maior tempo de apneia do paciente durante a intubação sem que ocorra dessaturação. 

Pré-tratamento

Consiste na administração de drogas para diminuir os efeitos indesejáveis da laringoscopia e da intubação. As drogas devem ser administradas três minutos antes da intubação. 

Existem duas drogas de destaque. O Fentanil, que atenua a descarga adrenérgica e é principalmente indicado em casos de síndromes coronarianas agudas, dissecção aguda de aorta, hipertensão intracraniana ou AVE hemorrágico. Ou a lidocaína, que atenua a hiperreatividade das vias áreas, indicada para pacientes com hipertensão intracraniana ou broncoespasmo.


Paralisia e Indução

Essa etapa é caracterizada pela administração de uma droga hipnótica seguida de um bloqueador neuromuscular em bolus e de forma rápida. Primeiro o hipnótico; em seguida, o bloqueador neuromuscular.

Existem algumas opções de drogas hipnóticas. Muitos estudos colocam o etomidato como a droga de escolha para a ISR. É um sedativo-hipnótico de curta ação, sem ação analgésica, que não causa instabilidade hemodinâmica ou disfunção miocárdica. Por isso, é ideal para pacientes críticos em geral. Entretanto, mais estudos ainda são necessários para avaliar a possibilidade de supressão adrenocortical a médio ou longo prazo.

A Quetamina promove analgesia, amnésia e sedação e é a droga de escolha em pacientes com broncoespasmo, pois possui propriedades broncodilatadoras. Tende a aumentar a pressão arterial, portanto é contra-indicada em pacientes com cardiopatia isquêmica, emergências hipertensivas ou casos de dissecção aguda de aorta. 

O Propofol é um hipnótico que pode causar venodilatação e depressão miocárdica.


O Tiopental é um barbitúrico que tem o efeito mais rápido e previsível, com menos instabilidade hemodinâmica que o propofol. No entanto, é pouco disponível e pode haver sequelas prejudiciais caso haja extravasamento ou injeção intra-arterial. 


Midazolan é um benzodiazepínico que causa significativa depressão miocárdica e respiratória e tem lento início de ação.


Em relação aos bloqueadores neuromusculares, a Succinilcolina é a droga mais usada na ISR. É despolarizante, tem rápido início de ação (menos de um minuto) e curta duração (menos de 10 minutos). Deve ser evitada em casos de hipercalemia ou rabdomiólise. 


O Rocurônio é não despolarizante e é uma opção quando existe contra indicação para a succnilcolina ou quando o paciente pode evoluir com hipercalemia.


Em paciente em choque, uma dose muito modesta de hipnótico pode ser suficiente, pois essas drogas podem levar ao colapso circulatório e parada cardíaca. Medicações para ressuscitação cardiopulmonar devem estar prontamente disponíveis.


Posicionamento e colocação do tubo

Após 20 segundos da infusão sequencial das drogas, o médico deve posicionar o paciente para alinhar os principais eixos. A cabeceira deve estar a zero grau. Em seguida, realizar a laringoscopia e introduzir o tubo. Após a visualização da passagem pelas cordas vocais, o fio guia pode ser retirado. Na maioria das pessoas, o número 22 do tubo na altura da rima labial está adequado.

O uso da pressão cricoide (manobra de Sellik) é controverso, pois se a força aplicada não for suficiente não se previne o refluxo gástrico e a manobra não é isenta de riscos. Se realizada de forma incorreta, pode prejudicar a laringoscopia.


Pós-intubação


Após a confirmação da intubação, o balonete deve ser inflado e o tubo, fixado. Solicitar a radiografia de tórax, colocar o paciente em ventilação mecânica e avaliar os sinais vitais do paciente, pois a hipotensão é comum após a intubação.          
  

Conclusão

A intubação orotraqueal é um procedimento comum e que gera certa ansiedade na prática médica. O êxito do procedimento depende do adequado preparo do ambiente, do paciente e da equipe médica. É importante lembrar que os métodos devem ser adaptados a cada tipo de paciente, e que o profissional mais experiente deve estar sempre no comando da situação utilizando-se das técnicas que possui maior habilidade, visando assim o sucesso do procedimento.




Referências

1.   Tallo, F. S. et al. Intubação orotraqueal e a técnica da sequência rápida: uma revisão para o clínico. Ver Bras Clin Med. São Paulo, n, 9, n.3, p 211-7, 2011.

2.  Daniel G et al. Rapid sequence intubation in the emergency department. The Journal of Emergency Medicine, volume 13, Issue 5, September–October 1995, Pages 705-710.


4.     Sellick BA. Cricoid pressure to control regurgitation of stomach contents during induction of anaesthesia. Lancet 1961;2:404-406

5. Vianna PTG, Ganem EM, Takata I. Avaliação comparativa do tempo de latência da succinilcolina e do rocurônio Rev Bras Anestesiol 1996;46:(Suppl):147